quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Das confusões por ser surdo

Onde trabalho atualmente quase todo mês estão mudando as faxineiras. Quando comecei a trabalhar não havia esse rodízio excessivo. Lembro que a faxineira do andar ficou mais de um ano trabalhando lá. Com o excesso de troca eis o que ocorreu recentemente. A faxineira sempre bate levemente na porta de entrada do banheiro, que tem um cubículo para o lavatório e dois banheiros, um à esquerda e outro à direita deste cubículo.
A porta para o cubículo central não tem trinco, pois é entrada para o lavatório. Somente os banheiros têm trincos. Claro que quando ela bate na porta os homens fecham a porta do banheiro em que estão ou simplesmente respondem que "tem gente". A última faxineira adentrou o banheiro umas quatro vezes e eu estava com a porta aberta e só fui fechar quando ela já estava no interior do cubículo central. Na quinta vez ela se sentiu incomodada e foi tirar satisfações com o responsável pelo setor de serviços gerais.
- Eu bato na porta e o rapaz não responde nada. E quando eu entro ele está lá fazendo xixi com a porta do banheiro aberta.
- Às vezes acontece, - responde o chefe, pacientemente, sem saber de quem ela estava falando - as pessoas não entendem que você está pedindo para que elas respondam à sua batida na porta.
A faxineira se irrita:
- Não, senhor! Este rapaz faz de propósito mesmo. Uma vez eu perguntei se tinha gente no banheiro e ele não respondeu nada. Quando eu entrei ele estava lá.
O chefe acabou curioso e perguntou:
- E quando você entra o que o rapaz faz?
- Ele empurra a porta do banheiro, assim quase fechando.
- Não falta o respeito com você?
- Não. Ele sempre quase fecha a porta. Uma vez ele estava saindo do banheiro e riu. Nunca falou nada comigo. Mas, eu acho uma falta de respeito não responder quando eu bato na porta ou quando eu pergunto se tem gente. Porque todo mundo responde, só ele não!
O chefe pensou que realmente era um caso para advertência, afinal a faxineira só pedia que o rapaz fosse educado e respondesse aos seus sinais.
- Quem é esse rapaz?
- Eu não sei o nome dele, não. Um rapaz de óculos, sério, que trabalha junto o A.
- Vamos lá falar com ele.
- Eu não quero falar nada com ele, não. O senhor só tem que chamar a atenção dele.
- Mas, você tem que me mostrar quem é ele. É uma coisa simples, não se preocupe. Você me mostra o rapaz e eu explico para ele o que está acontecendo. Você está certa, portanto ele tem que entender.
Quando chega no meu setor, a faxineira me aponta. O chefe me conhece, sabe que sou 100% surdo. Aponta para mim, solicitando confirmação, já com um riso largo no rosto:
- É ele?
- É ele sim, senhor. - responde a faxineira, meio temerosa.
Não tem jeito. O chefe de serviços gerais começa a rir alto. O pessoal do setor olha para o chefe e eu, é claro, olho para onde todo mundo está olhando, para saber o que está acontecendo. Ao ver o chefe de serviços gerais e a faxineira, praticamente já sei o que está acontecendo. Ao perceber todos olhando e o chefe rindo, a faxineira fica ainda mais tímida diante da situação. Ele explica a situação para o pessoal do meu setor; todos acabam rindo também. O chefe de serviços gerais praticamente a arrasta até onde estou e diz:
- Jairo, você conhece a M.?
- Sim, a faxineira aqui do nosso andar.
- Ela não te conhece. M, esse é o Jairo. Ele é surdo, entendeu?
E o chefe desata a rir novamente. A faxineira me fita completamente desconfiada, pensando que estavam brincando com ela. O A. se aproxima e explica para ela que eu não escuto, mas falo normalmente. Ela acaba concordando, mas provavelmente vai confirmar com outras pessoas ("aquele rapaz é surdo mesmo?"). Colegas já me disseram que uma ou outra pessoa pergunta isso, desconfiados, com cara de espanto.
:D

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