sábado, 22 de setembro de 2012

Flashes da vida


Meu cunhado comentou que não esquecia que eu estava presente em um momento muito difícil da vida dele.
- Que momento? – perguntei, rindo, porque não sabia ao que ele se referia.
- Quando eu me separei. Quando fomos buscar as coisas, ao final da mudança, eu estava triste, fitando a parede. Você chegou, passou o braço pelo meu ombro, falou “vamos, cara. A vida continua...”. Nunca me esqueci disso.
Era estranho, porque eu não lembrava este fato. Mas, compreensível, visto que o momento era importante para ele, não para mim.
Assim também são alguns momentos que tive com outras pessoas do meu viver. São momentos insignificantes para as outras pessoas, mas extremamente importante para nós.

Eu tinha cinco anos e estava à mesa da casa do meu avô. E ficou gravado em minha memória, a voz de entonação forte, mas calma, de meu avô falando:
- Come o angu, menino!
Não lembro do prato, da mesa, das outras pessoas. Só do meu avô falando isso. Poucos meses depois ele faleceu. Eu estava no colo de minha mãe, que chorava. Eu lembro mais nitidamente de minha mãe chorando do que do meu avô no caixão.

Já surdo, morando aqui em Belo Horizonte, quando minha irmã mais velha casou eu ficava com ela, até meu cunhado chegar. Eu tinha 15 anos e ainda cambaleava muito se andasse em um local pouco iluminado e com chão irregular (ainda cambaleio, mas, após tantos anos surdo, o senso de equilíbrio se adapta razoavelmente). Meu cunhado chegava e me levava até a casa das minhas outras irmãs. Lembro que um dia a rua estava com as lâmpadas apagadas e eu comecei a cambalear muito, igual a um bêbado. Meu cunhado simplesmente passou o braço pelo meu ombro e assim fomos até chegar em casa. Ele não falou nada, não perguntou nada. O gesto ficou marcado, pela simplicidade.

Meu outro cunhado, atleticano, que a gente diz “doente”. Mas, não fanático. Nunca discutimos nada de Atlético e Cruzeiro. Comentamos numa boa, conversamos numa boa, mas evitamos polemizar. Foi justamente ele que me levou ao Mineirão para ver um jogo do Cruzeiro, pela primeira vez, eu com 16 anos. Ele e minha irmã, que também é atleticana, ficaram comigo na torcida do Cruzeiro.

Quando eu ia para Formiga nas férias escolares ou feriados, chegava e conversava muito com meu tio. Ele perguntava como estavam todas minhas irmãs, o que eu estava fazendo e eu perguntava sobre todos de Formiga. Mas, a conversação era feita de um modo peculiar. Eu falava e, como eu não conseguia entender o que meu tio dizia, ele escrevia quase que todas as frases por inteiro. Foi assim durante os primeiros anos de minha surdez, até que a minha leitura labial se aprimorou e ele não precisava mais escrever as frases por inteiro.

Minha irmã mais velha me ajudava com os deveres (ela fazia Magistério). Era meu primeiro ano escolar, o  “para casa” pedia uma redação sobre fazenda. Minha irmã pediu que eu escrevesse num rascunho. Sem ter idéia do que escrever, peguei um livro de historinhas e copiei “O amanhecer na fazenda”. É incrível, eu lembro até o título da história que eu copiei. Incrível também a minha ingenuidade; mal sabia escrever o próprio nome e ali estava minha redação sobre o amanhecer na fazenda. Minha irmã vem ver o que escrevi e me dá um safanão, manda eu fazer uma redação simples, como se tivesse ido a uma fazenda. Isto é da época em que uma redação do tipo seria: “Fui para a fazenda. Vi uma vaca bonita. Um boi marrom.”, etc e tal. Simples, pois o vocabulário era limitado. Mas, eu era teimoso:
- Eu não copiei não. - disse, com a cara mais séria do mundo.
Eu só lembro da minha irmã soltando uma gargalhada.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Implante Auditivo de Tronco Cerebral

Uma reportagem conta a história de uma criança de 2 anos que nasceu com surdez profunda e recebe o ABI (Implante Auditivo Tronco Cerebral). Ela sofre de espectro óculo-aurículo vertebral, uma condição muito rara e sem cura que afeta os olhos, ouvidos e a espinha. Como ela não tem nervos auditivos, a solução era o ABI. Pouco tempo depois de receber o implante a criança já pronunciava "mamãe".
Leia a reportagem clicando AQUI.

A diferença deste implante para o IC (Implante Coclear) comum deve-se ao fator cóclea e nervo auditivo. O IC é implantado em pessoas que têm cóclea e nervo auditivo intactos. O ABI em pessoas que não possuem cóclea ou nervo auditivo. O ABI estimula diretamente o nervo auditivo que fica no tronco cerebral, sem necessidade da cóclea e do nervo auditivo. Para pacientes adultos, o resultado final do ABI é inferior ao IC. Por isso, quando o paciente é uma criança, quanto mais rápido for a implantação, mais rápido será o retorno com resultado final satisfatório. Tanto para a implantação do ABI ou do IC, em crianças a aprendizagem da língua oral ocorre de maneira incidental e em geral é quase idêntico ao de uma criança normal.

Parte interna do IC
 Quando da divulgação destes implantes (um personagem surdo de novela global, com IC e reportagem no Fantástico sobre ABI), grande parte da comunidade surda se posicionou contra os implantes. Debatendo este fato com meu amigo, quando ele disse que não aceitaria IC de forma alguma, eu disse:
- Eu também não, colega. Porém, devemos lembrar que já somos adultos, capazes de decidir por nós mesmos e todos os problemas que enfrentamos com a surdez superamos com muita determinação. Mas, devemos também respeitar os surdos que querem ser implantados. E como pais, sabemos que faremos o melhor para nossos filhos (eu e meu colega temos filhos ouvintes). Assim, quando pais decidem que farão IC ou ABI no filho bebê que nasceu surdo, não posso discordar. Não seria justo os pais aguardarem o filho crescer e ter noção da sua surdez e decidir se ele quer fazer um implante. Muitos surdos dizem que não fariam o IC nos filhos, porque somos felizes com nossa surdez.

Parte externa do IC


Informações sobre IC:

Da mesma fonte, informações sobre ABI: