domingo, 27 de fevereiro de 2011

Vagas de trabalho para deficientes

Quando o Ministério Público, em parceria com a Justiça do Trabalho, passou a fiscalizar o cumprimento da Lei 8.213/91, os deficientes passaram a ter uma ampla variedade de ofertas de emprego. Lembro que, debatendo com meus colegas surdos, eu disse que o cumprimento desta lei iria beneficiar a todos nós, mas também prejudicaria as instituições criadas para apoiar e empregar os surdos. Porque, a partir da lei, os surdos não precisariam mais das entidades que serviam de intermediários entre eles e as empresas. Outra coisa que afirmei com clareza foi que, sendo a surdez uma deficiência que não exigia adaptações nas empresas, os surdos seriam os mais procurados. Porque para empregar cegos e cadeirantes, a empresa necessita adaptar o ambiente de acordo com a deficiência do funcionário, o que não é o caso dos surdos. Hoje, as grandes empresas contratam surdos maciçamente, inclusive dão o treinamento e o acompanhamento necessário. Aqui na grande BH, o setor automobilístico também descobriu a vantagem de contratação dos surdos. Por parte deste setor e de suas fornecedoras de peças, ocorreu a contratação de mais de duas centenas de surdos, desde 2008.
Em primeiro lugar no ranking de contratação de deficientes, estão os deficientes físicos, que têm perda parcial dos membros. Devido a leve deficiência, são os mais contratados. Os surdos são o segundo grupo mais contratado, devido aos fatores acima citados. A quantidade de ofertas de emprego para os deficientes está superando a quantidade de profissionais deficientes capazes. Reportagem do jornal Super Notícia, de 24 de fevereiro, coloca como manchete justamente a dificuldade das empresas em contratar deficientes.

Leia a reportagem on line do jornal Super Notícia (clique AQUI)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Veículo próprio para cadeirantes

No blog do Flávio Gomes, tomei conhecimento deste projeto para um carro totalmente adaptado aos cadeirantes. É um projeto muito interessante.


 
Como está bem explicado no site dos criadores do carro, este não é um carro adaptado para cadeirantes e sim um carro construído especialmente para eles.


A maior praticidade deste veículo é que o cadeirante não precisa de uma pessoa para transferí-lo da cadeira de rodas para o assento de motorista, pois a própria cadeira de rodas é o assento.

O site da Pratyko tem mais fotos e detalhes sobre o carro.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Jornal Ab+surdos

Outro dia, vendo os vídeos que o próprio Google seleciona sobre os temas que eu escolhi (humor, surdos, games, Gran Turismo), assisti a esse jornalzinho produzido pela Kitana e Many. Uma característica de muitos surdos é a capacidade de interpretação. E estas duas estão acima da média.
Os vídeos no lado esquerdo podem ser assistidos sem sair da página, bastando clicar em um de seu interesse.
Ao término, basta clicar em Acabei de Assisitr.

Tem muito vídeo de música, mas como eu já disse, a seleção dos vídeos é do próprio Google. Eu apenas escolho os tipos de vídeo para serem exibidos.

Mas, o Jornal Ab+surdos merece um destaque à parte. Dá para entender mesmo não conhecendo Libras completamente.

As duas apresentadoras estão de parabéns.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A cruz preta.

Eu e meu amigo Tonho ajudamos a mudança de um dos nossos vizinhos. Ao fim da trabalheira voltamos na casa vazia e nos objetos descartados pela família que mudava, meu amigo pegou uma cruz pintada de preto, com base para ficar de pé, feita em madeira (um dos filhos da vizinha trabalhava na madereira que havia na Rua 13 de Maio).
Muitas vezes eu ia na casa do meu amigo cedo, chamá-lo para jogar bola. Como eu era "de casa", ia entrando e muitas vezes eu que o acordava. Numa destas vezes após acordá-lo, observei:
- Por que você colocou a cruz no chão e não no seu criado-mudo?
O Tonho, que escrevia as frases com o alfabeto manual dos surdos numa velocidade incrível, respondeu:
- Ué, ela estava em cima do criado. Devo ter derrubado de noite, sem ver.
Sem nos preocuparmos mais com isso, fomos jogar bola. Dias depois, coincidência ou não, quando fui acordá-lo, a cruz estava no chão novamente. Também os cigarros (a gente fumava naquela época), o isqueiro e a carteira. Ele achou estranho desta vez e comentou:
- Mais estranho é que não dormi muito bem. Tive uns sonhos ruins...
Alguns dias depois, à noite, estávamos conversando no quarto dele e eu perguntei:
- Cadê a cruz?
- Resolvi tirar daí. Depois que você notou a cruz no chão, eu passei a perceber que todo dia eu acordava e a cruz, meus cigarros, o isqueiro e o que mais eu colocasse no criado ia parar no chão.
- Você tá brincando!!
- Não! Minha irmã - que tinha um quarto próximo - já me falou que de noite escuta eu jogando as coisas no chão. Um dia ela pensou que eu estava meio "de fogo" (bêbado) e levantou para me xingar. Mas, acendeu a luz e viu que eu estava dormindo.
- Você acha que é culpa da cruz?
- Antes de eu trazer esta cruz para cá, nunca aconteceu nada disso. Mais estranho é que tenho pesadelos quase toda noite.
Nós éramos bastante religiosos à epoca. Íamos à missa aos domingos, participávamos de Grupo de Jovens, visitávamos o asilo, o orfanato e hospitais. Difícil crer que uma cruz preta estaria fazendo algum mal. Em matéria de religião não gostávamos de brincadeiras e eu sabia que o Tonho não estava mentindo. 
- Onde você colocou a cruz?
- Aí é que está, Jairo. Não sei o que fazer com ela. Estou com medo de queimar. Pensei em jogar no lixo, mas não quero que ninguém encontre esta cruz mais.
Ele buscou a cruz, que estava na sala. Ficamos olhando espantandos para aquele objeto de madeira, pintado de preto, inofensivo, um símbolo religioso que lembrava Cristo. Não estávamos temerosos, apenas um tanto incrédulos. Seria a cruz mesmo que estava causando tantos dissabores noturnos ao meu amigo? Calados, fitando a cruz, a irmã do meu amigo chama:
- Tonho?!?
Ele dá um pulo, assustado; o susto dele me assusta mais ainda e eu, que segurava a cruz, joguei-a longe.
A irmã do Tonho se espanta:
- Que isso? Que vocês estavam fazendo?
Eu e o Tonho desatamos a rir. Pegamos a cruz e o Tonho contou a história.
- Que faço com essa cruz agora?
- Já levaram os entulhos da casa da D. Edite?
- Não, porque?
- Põe a cruz de volta onde você pegou.
Foi o que o Tonho fez. No outro dia eu cheguei cedo, ele já estava acordado e percebeu minha curiosidade sobre como tinha transcorrido a noite:
- Estranho mesmo! Não tive pesadelos. Meus cigarros e meu isqueiro ficaram em cima do criado. Tudo normal.
Nunca tivemos uma explicação lógica para esta história. Pelo sim, pelo não, nunca desrespeitei qualquer símbolo religioso, de qualquer religião.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Chama o Dunga!

Não assisti todo o jogo, pois estava dentro do ônibus durante o primeiro tempo, voltando do trabalho. Mas, quando liguei a tv, aos 12 m do segundo tempo, o Brasil perdia de 1x0 para a França. Eu me animei a assistir porque agora o Mano Menezes é global, concede as entrevistas exclusivas para a Globo, escala jogadores que o Galvão considera os melhores do mundo e por aí vai. Na verdade, acreditei que MM iria motivar a seleção, independente da Rede Globo.
Que decepção! Jogadores sem qualquer ânimo, sem raça, sem entusiasmo. Trocando trocentos passes para frente e para trás sem ultrapassar a linha do meio campo. Não importa se no resumo do jogo leio que o Brasil começou jogando bem. Ora, estava perdendo de 1x0 e o time não atacava, não conseguia passar do meio de campo. Mostrava que estava com medo, pois quando a França tomava a bola, o time recuava. Fiquei nervoso e nem assisti os últimos minutos direito.
Mano é global e não haverá uma campanha dissimulada pela sua queda. Já perdeu duas para grandes times, mesmo placar de 1x0, para Argentina e agora a França. O resumo do site esportivo da Globo não critica o futebol apresentado pela seleção. Afinal, Mano não é Dunga...
Mas, chamem o Dunga!
Não precisa nem ser o treinador, basta que ele dê as famosas broncas e faça a cobrança de raça e determinação de qualquer um que vista esta camisa amarela. Pois foi o que eu senti que estava faltando.

Para ler o resumo do jogo e ver o vídeo do gol da França, clique aqui (a Globo era a única emissora brasileira transmitindo o jogo). O título é "Brasil sucumbe ao fantasma da camisa 10 e segue freguês da França". Conversa... que fantasma o que? Sucumbe ao péssimo futebol apresentado, isso sim!

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Dominique, nique, nique...

Nos anos 60 o rádio era muito mais popular que a tv e, na casa do meu primo, o rádio ficava ligado quase o dia inteiro. Eu e meu primo brincávamos ao som das músicas da Jovem Guarda. Na minha casa não tinha rádio, mas eu ouvia muitas músicas de tango, bolero, boêmias, carnaval, que minha mãe vivia a cantar. Meu tio tinha discos de 72 rpm (caramba, algumas pessoas sequer sabem o que é isso) de moda de viola. Eram músicas engraçadas e divertidas. A internet possibilitou conhecer as letras de muitas músicas que eu sabia somente o refrão.
Uma música daqueles tempos, que minha memória auditiva ainda lembra os sons do violão::
"Dominique, nique, nique,
sempre alegre esperando
alguém a quem possa amar.
O seu príncipe encantado,
seu eterno namorado.
Que não cansa de esperar."
Esta música, na verdade, é uma adaptação de Dominique, uma canção popular francesa de cunho religioso. Gravada por uma freira, Soeur Sourine (Irmã Sorriso) da Bélgica. A música vira sucesso, atinge os primeiros lugares no EUA (superando Elvis Presley). Em 1966, ainda no rastro do sucesso das músicas gravadas sob o codinome de Irmã Sorriso, fizeram um filme, estrelado por Debbie Reynolds (mostrando somente o lado religioso). A freira era polêmica, considerava a Igreja Católica muito conservadora, defendia a pílula anticoncepcional. Larga o hábito e tenta carreira como cantora. A belga Jeanine Deckers, o nome verdadeiro da Irmã Sorriso, não conseguiria alcançar a fama sem o hábito. A defesa de assuntos polêmicos complica sua vida, pois a Igreja era muito forte naqueles anos. E vivia junto com outra ex-freira, Annie Pesche, causando ainda mais polêmica. Os problemas aumentaram e por pressão da Igreja Católica o governo resolveu cobrar impostos sobre seus trabalhos artísticos. Como os ganhos como Irmã Sorriso iam todos para o convento, ela acabou tendo todos seus bens penhorados (é o lado triste da minha Igreja Católica: quando quer prejudicar alguém, ela prejudica). Deprimida, suicidou-se, em um pacto de morte com sua companheira, em 29 de março de 1985. As duas foram enterrada juntas.
Jamais imaginei que por trás daquela musica tão animada houvesse uma história trágica. Bem que os versos da versão brasileira cantam no final:

"Dominique, nique, nique,
Sempre triste a chorar
o amor que se acabou.
O seu príncipe encantado,
seu eterno namorado
Que se foi e não voltou."

Letra e música da versão brasileira gravada pela cantora Giane Clique aqui

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Brincadeiras da infância

O garrafão não era uma brincadeira muito infantil, devido à sua agressividade. Também era uma brincadeira exclusivamene masculina (pelo menos no meu tempo). Era uma forma subjacente de alguns colegas que não se davam bem, terem a oportunidade de atingir o outro sem brigar. Na hora do recreio, alguém trazia um giz e desenhava um garrafão no chão. A turma toda ficava dentro e o pegador fora. Marcávamos o pique, onde o penalizado deveria tocar para livrar-se do linchamento. O pique, na maioria das vezes, era longe do garrafão. O pegador só podia entrar pela boca da garrafa. Os participantes podiam sair pelas laterais, mas neste caso, enquanto o pegador não saísse do garrafão, era obrigado a ficar pulando num pé só. Se o pegador tocasse um dos participantes (eu, por exemplo) berrava: "lincha o Jairo!". O pegador também podia denunciar: "O Jairo pisou na linha (do garrafão)! Lincha o Jairo!". Era o momento de maior tensão do jogo, pois o penalizado tinha que correr até o pique. Só que os demais participantes faziam o linchamento, sem dó nem piedade. Eram tapas fortíssimos nas costas até conseguir tocar o pique. A minha vantagem era a velocidade. Como eu era bastante veloz, chegava até o pique sem levar muitos tapas. Meu primo não era veloz, mas "driblava" os que o perseguiam com facilidade. Eu não linchava somente duas pessoas, um amigo boa praça e o meu primo. Mas, como eu disse antes, esta brincadeira permitia atingir desafetos sem partir para uma briga. Nos meus dois últimos anos ainda ouvindo, na Escola Normal, tive muitas desavenças com dois irmãos, que eram filhos do delegado e gostavam de azucrinar os colegas. Como eu os confrontava, eles viviam tentando provocar brigas comigo. Mas, apesar de não temê-los, não era bobo de sair na pancada com filhos de delegado. O garrafão era a válvula de escape para nossas desavenças. Na maioria das vezes quase todos esperavam o penalizado passar e lhe enchiam um tapa nas costas. Mas, quando se tratava deles, eu fazia questão de acompanhá-los (correndo junto) até o pique, claro, castigando as costas com tapas fortíssimos. É claro que quando eu era o penalizado, eles também faziam a mesma coisa e minha única vantagem era realmente a velocidade, pois eram dois contra um.
Hoje vejo que a molecada usa bullying, uma forma muito mais prejudicial para resolver desavenças. Conseguem afetar a vida de um colega com terror psicológico ou físico. Conseguem até mesmo afastar colegas da escola.
Nunca houve brigas por causa dos "linchamentos", pois todos participavam cientes das regras do jogo.

Mais ou menos três meses depois que fiquei surdo, passeando com minha mãe no centro da cidade (Formiga), os filhos do delegado pararam e conversaram comigo, melhor dizendo, com minha mãe, pois eu ainda não conseguia fazer leitura labial e tinha muita dificuldade de entender até mesmo meus familiares. Mas, foi legal eles terem parado e conversado comigo. As desavenças ficaram no garrafão da hora do recreio. Eles se interessaram em saber o que houve comigo, como eu estava e se voltaria a estudar com eles. Minha mãe tinha esperanças de que sim e disse que "Deus há de ajudar e ele volta a estudar antes do fim do ano". Mas, para a Escola Normal de Formiga eu nunca mais voltei.